quarta-feira, 12 de setembro de 2012

Faturamento maior pode significar ‘nada’ para o hospital, e ‘tudo’ para o médico

Para a operadora R$ 1,00 gasto é R$ 1,00 gasto, independente se foi para pagar um exame ou diária. Para um hospital não. R$ 1,00 recebido em diária fica ‘no bolso’ do hospital mas R$ 1,00 recebido de UM exame pode ficar 100 % ‘no bolso’ do médico.



Aumentar o faturamento pode não representar resultado ao hospital – poucas pessoas na cadeia de valores têm domínio sobre isso. Para entender devemos recorrer a 2 conceitos básicos:

Os preços são negociados por tabela, e cada tabela se referencia a um grupo de itens de faturamento. E em tudo que se refere a procedimento médico, ‘o médico é sócio’ do hospital de uma forma ou de outra, com mais ou menos participação na receita dependendo do caso (*).

(*) vamos deixar claro uma coisa antecipadamente: não sou contra nem a favor da participação de médicos, ou quem quer que seja na receita hospitalar. Para viabilizar um hospital pode ser necessário ou danoso que isso ocorra dependendo do contexto, ok ?

A participação dos médicos na receita dos procedimentos é um dos maiores desafios do administrador hospitalar, porque ele deve dosar não só o a receita x despesa de um determinado serviço médico, mas se mesmo tendo prejuízo neste serviço é vantajoso para o hospital por se tratar de ‘porta de entrada’ para outros.

E a condição muda constantemente … a análise que acabou de ser feita hoje deve ser reavaliada de tempos em tempos, porque lucro hoje pode significar prejuízo em alguns dias !

Este fato é o que mais diferencia o hospital da operadora de planos de saúde:

Para a operadora R$ 1,00 gasto é R$ 1,00 gasto, independente se foi para pagar um exame ou uma diária;

Para um hospital não. R$ 1,00 recebido em diária fica ‘no bolso’ do hospital mas R$ 1,00 recebido de um exame pode ficar 100 % ‘no bolso’ do médico, e ainda gera custo operacional fixo para o hospital.

Por isso aumentar o faturamento pode significar ‘nada’ para o hospital, e ‘tudo’ para o médico.

Alguns exemplos reais:

Prestei consultoria em um hospital que tinha cerca de 30 sócios, todos médicos, e os serviços de diagnóstico eram ‘loteados’ por grupos de sócios. O Diretor Comercial era sistematicamente pressionado a reajustar a CH da tabela de preços de procedimentos, e para conseguir isso com as operadoras abria mão do reajuste da tabela de preços de diárias e taxas do hospital.

Era ídolo dos sócios que cuidavam das áreas de diagnóstico, mas nunca era convidado para almoçar com o superintendente. Foi questão de tempo para que os demais sócios sugerissem a ele ‘um novo desafio na carreira profissional’.

Prestei consultoria em diversos hospitais em que o valor da consulta médica no ambulatório é subsidiada, ou seja, o hospital paga mais ao médico pela consulta do que consegue cobrar pela consulta da operadora. A ideia é ter prejuízo na consulta para compensar com o lucro de outra área. Em um deles o valor da consulta foi reajustado ocasionando aumento do faturamento mas proporcionalmente também no reembolso, e diminuindo o movimento. Houve desequilíbrio no geral causando prejuízo ao invés de lucro – o subsídio passou a inviabilizar o ambulatório.

Então, se existe algo que pode ser catastrófico na gestão comercial em saúde está associado a:

Simplesmente praticar o que é feito pelo mercado, sem analisar o contexto em que o hospital se enquadra;

Negociar reajustes de preços sem conhecer a estrutura básica de custos do hospital e, principalmente, as políticas de repasse aos prestadores.

Como se faz isso: trabalhando com o perfil de faturamento:

As operadoras fazem isso de forma mais simples e com maestria: apenas agrupando por credenciado e por tabela de preço, já que para ela R$ 1,00 gasto não faz muita diferença em relação ao ‘o quê’ (na maioria das vezes ! … é necessário analisar se tem rede própria credenciada, e outros aspectos que não cabem nesta discussão genérica). Ela só agrupa seu custo por grupo para simplificar a discussão do reajuste nas diversas tabelas de preços envolvidas na negociação comercial;

Os hospitais são amadores, e fazem isso com desdém: é comum se vangloriar por colocar mais dinheiro no caixa sem avaliar se ele vai sair com mais rapidez que entrou.

O amadorismo hospitalar generalizado é regido pela ‘mania do comercial’ de achar que não necessita envolver o administrador antes de bater o martelo em uma negociação, ou porque acha que ele o administrador não entende das práticas de mercado, ou porque se acha autossuficiente para decidir o que fazer.

Bem … neste penúltimo blog sobre aumento de faturamento estamos discutindo o cuidado que se deve ter quando se analisa o resultado real em consequência do aumento de faturamento, e isso é essencial para o assunto que vamos tratar no derradeiro blog sobre o assunto: a motivação, ou seja, porque pessoas que ganham salário fixo se preocupariam com o aumento do faturamento hospitalar ?

Por: Enio Salu.